🔓 Jacques Fux e Raquel Matsushita lançam obra sobre memória

"As coisas de que não me lembro, sou"propõe um jogo em que se revisitam memórias muitas vezes inacessíveis, como as da primeira infância
Jacques Fux, autor de “As coisas de que não me lembro, sou”
10/06/2022

O novo livro do escritor e pesquisador Jacques Fux, As coisas de que não me lembro, sou, trata de forma poética das lembranças e gerações do testemunho e da pós-memória. O texto foi originalmente publicado na Revista da Academia Brasileira de Letras, em 2014, quando o autor fazia seu pós-doutorado em Literatura de Testemunho na Universidade de Harvard, e agora surge acompanhado das ilustrações surrealistas de Raquel Matsushita, colaboradora do Rascunho.

As coisas de que não me lembro, sou é dividido em três partes: “Tudo que lembro de não lembrar”, “Tudo que lembro de não compreender”, “Tudo o que me tornei em função de não me lembrar”. E, assim, a narrativa avança e retrocede no tempo, perpassando também algumas fases da adolescência, da juventude e da vida adulta de um personagem cujas memórias individuais estão entrelaçadas com outras coletivas, como a do mundo judeu.

“Inclui também o que esquecemos, transformamos, criamos e recalcamos. Eu estava trabalhando com o testemunho na literatura, e fiz uma imersão no tema. E, assim, escrevi esse texto que eu acho que é único na minha vida. É um texto muito bonito, muito sincero”, comenta Fux.

Dois autores com os quais ele estava dialogando bastante nos seus estudos foram Georges Perec (1936-1982) e Sarah Kofman (1934-1994), que passaram pelo trauma da Segunda Guerra Mundial e também produziram livros nos quais se valem de uma linguagem infantil, mas sem abrir mão da densidade das questões abordadas por eles. Produzir As coisas que não me lembro, sou”, para Fux, foi, de certo modo, realizar esse exercício de retorno a um “lugar” já esquecido mas ao mesmo tempo familiar para todo mundo.

A ilustradora Raquel Matsushita, que também assina o projeto gráfico livro, conta que identificou no texto de Fux um forte viés psicanalítico, o que a guiou no processo de produção das imagens, construídas basicamente em duas cores, preto e branco. “O livro trata de uma memória ‘esquecida’, mas é justamente por meio dela que o narrador conta as histórias e reconstrói a si mesmo. No paradoxo do ambiente escuro das não-recordações, o narrador se revela em forma de fragmentos”, pontua a artista.

“O projeto gráfico do livro propõe intensificar a ideia de fragmentos com pequenos trechos de texto distribuídos nas duplas. Ainda sobre esses trechos, um novo fragmento de texto é realçado por retângulos pretos ou brancos, que, por sua vez, se misturam com as ilustrações. O preto e branco (do papel) se revezam no protagonismo de cada capítulo. Também foram pensados como uma alusão à lembrança e não-lembrança do narrador, a luz e a sombra”, completa.

Matushita também buscou referências em obras de artistas que fizeram parte ou dialogaram com o surrealismo, como René Magritte (1898-1967), Leonora Carrington (1917-2011), e Tarsila do Amaral (1886-1973), entre outros. “As ilustrações foram criadas livremente sobre essas obras, sendo, portanto, uma releitura, uma reconstrução do passado. No conjunto de 20 ilustrações, houve a preocupação em escolher artistas brasileiros e também em equilibrar os gêneros (9 mulheres e 11 homens). Ao final do livro, há a relação das obras e artistas selecionados”, pontua.

Rascunho

Rascunho foi fundado em 8 de abril de 2000. Nacionalmente reconhecido pela qualidade de seu conteúdo, é distribuído em edições mensais para todo o Brasil e exterior. Publica ensaios, resenhas, entrevistas, textos de ficção (contos, poemas, crônicas e trechos de romances), ilustrações e HQs.

Rascunho